O ano era 2010, não lembro ao certo como surgiu a ideia. Mas, lembro que estávamos naquela de refazer as grandes expedições que já foram feitas pelos pioneiros grupos espeleológicos nas cavernas Baianas.
Um ano antes a gente já tinha chegado ao célebre salão caatinga na Toca da Barriguda, seguindo os passos do grupo Bambuí, e dessa vez a gente foi seguir os passos do pessoal da SEE que na década de 70 fez o mapa da gruta do convento.
E nessa empolgação foi que fizemos nossa primeira tentativa de atravessar toda essa caverna que com seus 10 km de extensão figura entre as 10 maiores cavernas do Brasil.
Lembro também que era feriado da semana santa e a essa época nenhum de nós tinha veículo.
Por um desses eventos casuais, um primo de Ronald teve de deixar o carro com ele por um final de semana. Era a oportunidade que não poderíamos desperdiçar. Então, Eu, Ronald, e Diogo pegamos a estrada em um Ford Fiesta "emprestado" de um primo de Ronald, e fomos bater lá na casa do seu Dermeval, no povoado de Casas Velhas.
Com toda a paciência que lhe é peculiar seu Dermeval foi nos explicar sobre as várias entradas da gruta do Convento, e que para eles da região cada entrada é uma nova caverna, porém, para os espeleólogos como as entradas se interconectam formam tudo uma única caverna.
Com toda a paciência que lhe é peculiar seu Dermeval foi nos explicar sobre as várias entradas da gruta do Convento, e que para eles da região cada entrada é uma nova caverna, porém, para os espeleólogos como as entradas se interconectam formam tudo uma única caverna.
Os personagens dessa expedição: Ronald Carvalho, André Vieira, Diogo Rios e Seu Dermeval.
Para o melhor entendimento dessa postagem vou utilizar os mapas retirados do livro as Grandes Cavernas do Brasil de Auler, Rubbioli e Brandi 2000.
A primeira metade do mapa escaneado do livro as grandes cavernas do Brasil. A parte (hachurada) mais escura nos condutos, significa que o local é alagado.
Nessa primeira parte do mapa, observamos a entrada principal da caverna que descende até um grande salão e que após algumas dezenas de metros se bifurca, em dois ramos, o ramo ao sul é estreito e possui alguns lagos profundos, ao que parece esse ramo fecha a poucos metros antes de se ligar a outra caverna chamada Toca do Martiliano. Esse trecho ainda não foi explorado até o final por nós do grupo CAACTUS.
O ramo que segue na direção norte, atinge grandes proporções até ser interrompido por claraboias permitindo acesso a superfície e portanto para os moradores é o termino do convento e a entrada para outra caverna.
Essa foto mostra o grande salão da entrada, a foto foi tirada em 2012 durante a visita pedagógica com uma turma escolar.
A gruta do convento apresenta drenagens intermitentes o que significa que a depender da época do ano, os condutos da caverna podem apresentar extensos lagos subterrâneos. Apesar de pobre nos tradicionais espeleotemas (estalactites e estalagmites) possui belos exemplos de espeleotemas formados sob a água como por exemplo, cones e jangadas.
Essa nata flutuando na água é o espeleotema conhecido como jangada. Nas épocas secas as jangadas se empilham e solidificam em espeleotemas conhecidos como cones.
Essa fotografia é uma parte do convento que fica na parte do mapa que está alagada embora na data da foto estivesse seca. É possível observar os cones, no centro do salão. Esses espeleotemas subaquoso foram formados por anos de acumulo de jangadas.
O final dessa parte do mapa termina em uma claraboia, que nada mais é que uma abertura no teto, provocada por um desabamento. Essa abertura da acesso a superfície e para seu Dermeval ali é conhecido como saída do convento ou então saída mandacaru. Essa saída é emoldurada por um enorme travertino.
Claraboia, ou desabamento do teto dividindo a caverna em duas partes.
Travertinos são barreiras escalonadas feitas de calcita ou outros minerais e que se desenvolvem com a cavidade voltada para o fluxo da solução de água com carbonatos, em outras palavras esses travertinos se desenvolvem formando as paredes de uma barragem de água subterrânea. O fluxo turbulento promove a precipitação vertical do carbonato dá água formando a parede que mais tarde será chamada de travertino. Quanto maior for o fluxo de água maior será o travertino e seu decaimento.
Esse é o grande travertino na saída mandacaru, ( claraboia bem na metade da gruta do convento) esse travertino tem cerca de 15m de extensão e chega a 2,5 de altura.
Até esse travertino o trecho é bem conhecido e muito visitado, pois até esse local devido a horizontalidade e grandes dimensões dos condutos, o acesso é fácil.
Agora vejamos a outra parte do mapa.
O escaneamento do livro não ficou bom e perdemos uma parte do mapa nessa figura, seja como for, essa parte é uma continuação do mapa anterior.
Logo após o grande travertino, chegamos a superfície mas a caverna continua. Em dois ramos, o ramo oeste vai dar na entrada que os moradores locais chamam de gruta do buracão, e o ramo que continua na direção do extremo norte vai parar em duas entradas cada uma em uma fazenda diferente.
Bom, então a nossa empreitada seria entrar pelo buracão e chegar até a saída mandacaru ( esclarecendo mais uma vez, no mapa a saída mandacaru é apenas um desabamento do teto e fica bem no meio da gruta).
Parecia mais fácil que percorrer o trecho estreito sentido norte que nos levaria a outras entradas. Segundo o próprio Dermeval, o que ele escutou do pessoal da SEE é que esse trecho estreito possui desníveis acentuados que quando corre água forma pequenas quedas e cachoeiras, obviamente ficamos tentados a explorar, mas, deixaríamos para outra oportunidade. Nosso objetivo era mais simples, seguir o trecho entrada buracão e chegar até a entrada principal do convento.
Essa é a "entrada" buracão. Esse é o sumidouro principal da caverna, e responsável pela formação dos condutos de grande volume.
Esse trecho é pouco conhecido da população a maioria tem receio de entrar nos condutos alagados. Nosso percurso também começou com bastante cautela, o conduto começa com muita água e não dava pra saber a profundidade, embora água seja bem transparente, a quantidade de jangada não permitia ver com nitidez, sendo assim, percorríamos o trecho "tateando" passo a passo, procurando firmeza no solo embaixo da água.
Devido a grande quantidade de jangada, mal dá pra saber onde começa a água, mas nessa foto logo a nossa frente tem um grande lago.
na maior parte do trecho inicial o nível da água era até a cintura.
No meio do trajeto em direção a saída mandacaru nos deparamos com incríveis travertinos, muitos deles submersos o que aguça a nossa imaginação com o tamanho que devem ser esses travertinos na época seca. A visão dos travertinos é estonteante, eles serpenteiam por entre o grande salão formando barragens sinuosas. Nem as fotos são capazes de expressar o que sentimos ao ver esses lindos espeleotemas.
Espetáculo visual que forma esses grandes travertinos.
Após os travertinos gigantes, começa a parte mais tensa do percurso, muita lama, muita lama mesmo. As botas triplicavam o peso devido a lama acumulada, em meio a tanta lama aparece um salão com intermináveis pilhas de guano, essas pilhas continham muitos fungos, e veio logo a cabeça que dessa vez iriamos contrair histoplasmose.
Sempre em frente, logo depois da lama retornam os grandes lagos. Dessa vez com maior profundidade, Ronald ( 1m 52 cm) não demorou muito pra ficar com água no pescoço.
Sempre em frente, logo depois da lama retornam os grandes lagos. Dessa vez com maior profundidade, Ronald ( 1m 52 cm) não demorou muito pra ficar com água no pescoço.
Largos condutos alagados
A partir desse trecho o nível da água aumenta bruscamente
Um dos trechos com bastante lama.
Enfim chegamos em um ponto crítico. Tentamos varias passagens e nenhuma era promissora, em todas o lago se mostrava muito profundo e extenso para fazer a travessia a nado. Até que encontramos um trecho curto que dava pra nadar, ate o outro lado seco. Antes de se jogar na água, observamos um estranho fenômeno, a água transparente do lago nos permitia ver um fluxo, algo como uma corrente de água que corria com velocidade na parte de baixo do grande lago cristalino. Fui o primeiro a fazer a travessia, as botas pesadas com lama, a mochila nas costas e no meio do trajeto, a luz do carbureto apagou. Fiquei completamente no escuro, e o medo de ser sugado pela corrente tomou conta de mim, ainda assim terminei e cheguei no outro ponto do lago. Jogaram uma corda e depois fizemos um esquema que permitia a travessia dos equipamentos e de seu Dermeval que não sabia nadar.
Tamanho esforço foi em vão, o lado pelo qual atravessamos não continuava, ficamos novamente ilhados e decidimos que era hora de retornar frustrados por não completar nosso objetivo.
Antes de voltar ainda houve tempo para o pessoal curtir com minha cara por que não queria atravessar nadando, optei por passar pela corda assim como seu Dermeval.
Retornamos pelo mesmo caminho, e antes ainda explorei um pouco o estreito conduto ramo extremo norte. É um conduto mais quente e com passagens bem estreitas; Estávamos muito cansados e desanimados para continuar.
Conclusão valeu pela vista dos travertinos gigantes, mas estamos com essa travessia engasgada na garganta e queremos a todo custo terminar todos os condutos da gruta do convento. Comprem seus botes, seus coletes salva vidas e juntem se a nós na próxima tentativa.
Ainda terei a hora de poder desfrute dos espeleotemas propostos pela "Majestosa Convento"
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