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sábado, 4 de outubro de 2014

GRUTA DA PEGUENTA: OS PRIMEIROS ARTISTAS


Quem mora na sede de Campo Formoso ou nas cidades vizinhas nem imagina, que muito próximo dali, em paredões, abrigos e cavernas fascinantes no interior do município, ecoa sinais de um passado distante que nos informa sobre como nossos ancestrais habitavam nossas terras há milhares de anos. 
Sitio na ponta d´água em Campo Formoso. ainda sem registro oficial.

A arqueologia é a ciência que entre outras coisas busca resposta sobre o modo de vida de nossos antepassados, e as cavernas são um prato cheio para um arqueólogo, já que a civilização humana sempre teve uma relação muito próxima com as cavernas, que lhe serviram de abrigo e espaço para expressar sua arte. 

Pinturas rupestres da toca da tiquara em Campo Formoso, essas foram as primeiras pinturas estudadas no município. Foram estudadas pelo pesquisador Carlos Ott na decada de 40. Nessa epoca a caverna era chamada de buraco d´água.


Uma cidade com uma quantidade expressiva de cavernas como Campo Formoso, é esperado que em algumas delas encontremos vestígios desses antigos habitantes. E foi em busca de sistematizar essas informações que realizamos nossa primeira expedição para a região de peguenta situada entre os municípios de Campo Formoso e Umburanas e sendo acessível pela estrada que liga a sede de Campo Formoso para o povoado quilombola de São Tomé.

A expedição saiu na raça, já que poucas horas antes ainda restavam duvidas sobre quem iria? , quantas pessoas e em que transporte? Graças à força de vontade de todos e principalmente ao esforço de Tereza Rachel que conseguiu transporte coletivo no momento crucial. Conseguimos manter nossa meta de expedição dada é expedição cumprida e no dia 29 de setembro de 2014 realizamos nossa primeira incursão a região que certamente voltaremos anualmente. 

Contamos com 12 integrantes: Edemir Barbosa, Jorgean Silva, André Vieira, Edson Silva, Ivomar Gitânio, Filipe Kupi,Cintia Birne, Jessica Carolyne, Ágata Correia, Tereza Rachel, Mateus Henrique e Josan Dias.


Chegamos à Peguenta no já tradicional horário de meio dia. A região de Peguenta é caracterizada por um longo paredão calcário nas margens do leito seco do rio Salitre, um afluente do rio São Francisco. 
Um trecho da área cárstica da região de Peguenta.


Esse paredão drenava o fluxo do rio em eras remotas o que ocasionou a formação de várias cavidades naturais subterrâneas. A expectativa era que seriam pequenas e simples e, portanto faríamos a topografia rapidamente. Doce ilusão!


Escolhemos a primeira entrada pra começar a topografia da peguenta.

Os condutos baixos, com muito pó vão se estreitando e se ramificando formando uma malha de entradas e saídas do paredão que nos deixou com uma sensação de estar dentro de um queijo suíço.



A zona de penumbra já nos mostra o padrão de ramificação encontrado na zona afótica.

Aproveitamos pra nivelar os integrantes nas noções de topografia e cada membro assumiu uma das funções da equipe de topo. Inicialmente Edemir e Kupi foram explorar livremente as passagens enquanto que Jéssica assumiu a função de ponta de trena; Tereza de anotadora, Edson de instrumentista e Ivomar e Cíntia como croquistas. Depois as funções se alternavam entre os integrantes. 
As primeiras instruções . Detalhe para Cíntia que entrou na caverna de óculos escuro e comentou que a caverna era mais escura que o normal. 



Detalhes da topografia da gruta da peguenta.

Volta e meia Kupi e Edemir chegavam na equipe de topografia, com noticias de que tal e tal passagem leva a tal e tal conduto. Tivemos uma pausa para o almoço e retornamos a topografia que durou até o final da tarde. A sensação foi que não fizemos nem 1% da primeira entrada que escolhemos; Temos trabalho ali para um ano inteiro. 


A maior parte da peguenta são condutos de meia altura, porém algumas passagens estreitas nos levam ao que parece ser o maior conduto, com teto de 2m de altura. Não deu tempo topografar essa área nessa expedição.

Croqui da primeira expedição peguenta.

Deixaremos os detalhes da topografia para a próxima postagem sobre a peguenta, nessa vamos focar em outro aspecto curioso que encontramos por lá. A arte Rupestre: testemunhos arqueológicos que guardam importantes evidências da história da colonização humana em nosso território.

O pouco de informação que colhemos e a pequena prospecção que foi feita anteriormente revelou que a região possui inúmeros sítios com pinturas feitas nas rochas, pinturas essas conhecidas como pinturas rupestres. 

Qual o significado que guarda essas pinturas ? é a primeira pergunta que tentamos em vão uma resposta ao contemplá - las. 

Segundo a pesquisadora Nancy Munn a arte gráfica pré- histórica tem sido equivocadamente rotulada de geométrica ou abstrata. Munn relaciona os desenhos a um complemento de comunicação verbal e gestual, sendo que cada um representa um conjunto de significados. 

Um simples traço de forma geométrica simples pode representar uma lança, bastão de luta, bastão de cavar, homem ou fogo. Já elementos combinados formam cenas que podem se passar no acampamento, no espaço ritual, à caça, a procura por água entre outros temas. Em certos casos, poderiam ser complementares à fascinante pintura corporal ainda praticada por algumas tribos brasileiras.

Gabriela Martin, estudiosa da arte rupestre do nordeste do Brasil, assinala que pinturas tão comuns nos registros rupestres como: espirais, círculos radiados e linhas paralelas onduladas podem significar, ao mesmo tempo, dependendo do grupo cultural, símbolos femininos e masculinos, incesto, o movimento das águas ou a anaconda que transporta a humanidade.




Um fator complicador nas interpretações é que existem fragilidades relativas a cada tinta utilizada pelo pintor pré - histórico. Os pigmentos vermelhos fixam - se melhor nas paredes que os pastosos, como os amarelos e brancos, e desta forma,os amarelos geralmente aparecem na forma de manchas e podem estar sub- representados.

É possível, ainda, que tenham sido feitas pinturas com pigmentos vegetais e que desapareceram totalmente com o passar do tempo. A arte rupestre está impregnada de todas as marcas decorrentes do tempo, que eliminou algumas cores, figuras e, eventualmente, acrescentou tonalidades resultantes da ação de fungos e de outros agentes naturais.

Alguns pintores escolheram locais de difícil acesso em virtude da altura em que se encontram foi necessária a construção de andaimes ou algum tipo de escada para se ter acesso aos paredões; Em outras é necessário rastejar por condutos de 50 cm de altura. Nesses casos em que as pinturas estão em locais de difícil visualização, pode se dizer que foram feitos para permanecerem escondidos e, talvez, fossem locais restrito aos iniciados. 


No que se refere aos corantes. Maria da Conceição Meneses estudou as pinturas da Serra da Capivara, no Piauí, e estabeleceu a composição química das tintas. A cor vermelha é constituída de óxido de ferro misturado com uma substancia rica em cálcio; A cor amarela é goetita, um oxido de ferro hidratado. A branca era feita com duas espécies de tinta, kaolinita e gipsita; o cinza, por sua vez, é uma mistura natural dos pigmentos vermelho e branco. O preto foi conseguido de duas maneiras: através de carvão vegetal obtido com queima de madeira ou de carvão animal resultado da queima de ossos.



Esperamos que o interesse pela pré - história brasileira e sobretudo nordestina seja despertada pelas próximas gerações de jovens que habitam essas regiões com tamanho tesouro. Um universo com forte apelo estético, que nos conta a verdadeira história dos primeiros brasileiros. 

Voltaremos a região de peguenta, para continuar nossos trabalhos, tanto de topografia quanto de registro das pinturas, já nos informaram que as pinturas que vimos são apenas a ponta do iceberg, e que existe no mesmo paredão que segue o fluxo do rio salitre, painéis gigantescos repleto de arte dos nossos primeiros aristas.

Antes de finalizar a expedição ainda tivemos tempo para prestigiar o balneário na localidade de São Tomé, tirar a poeira do corpo, refrescar a garganta e ouvir muita prosa boa. 






Detalhes do balneário na região de são tomé




A parte cultura não pode faltar em um pós espeleo. 

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