Essa é mais uma postagem sobre os curiosos habitantes do
meio subterrâneo.
Nosso personagem faz parte do
grupo dos Crustáceos em que os exemplares mais conhecidos são os frutos do mar:
Lagosta, Camarão e Siri.
Para fazer parte desse grupo é
preciso ter um exoesqueleto resistente que protege um corpo segmentado. A segmentação do corpo é divida em cabeça,
tórax e abdômen, às vezes cabeça e tórax fundidos em cefalotórax, e cada
segmento com pares de apêndices. É característico
dos crustáceos possuírem dois pares de antenas, e que seus apêndices sejam
birramosos (isto é, bi - ramificado, de um eixo partem dois ramos, um interno
chamado endopodito e um externo o exopodito) Além disso, o ultimo segmento
abdominal não possui apêndice e é chamado de télson. No tórax os apêndices são chamados de
pereiópodes ou “patas de locomoção”; Enquanto que os apêndices do abdômen são
os pleópodes ou “patas nadadoras”.
Anatomia básica de um Crustáceo
Exemplo de apêndice birramoso tipico dos crustáceos.
Dentro dos crustáceos existem
várias ordens e o nosso personagem está em uma ordem conhecida como Isopoda ou
Isópode, as características dos crustáceos isópodes são: lateralmente achatados
e não possuir carapaça. O abdômen e o tórax têm a mesma largura, e as
duas regiões não ficam claramente demarcadas. Ao contrário dos demais crustáceos nos
isópodes alguns pleópodes são utilizados como brânquias. É nesse grupo de
crustáceos que está o único que é exclusivamente terrestre, são os isópodes da
família oniscidae, que popularmente são conhecidos como tatuzinho de jardim. Mas não é deles que vamos falar hoje.
Algumas fotos do isópode mais conhecido, o Tatuzinho - de - jardim, cientificamente conhecido como Armadillidium vulgare.
O morador misterioso das cavernas
sertanejas é um isópode aquático troglóbio (isto é, exclusivo de cavernas) da
subordem Calabozoidea .
Essa subordem Calabozoidea foi
criada devido a descoberta de um isópode cavernícola aquático encontrado na
Venezuela e descrito em 1983 com o nome de Calabozoa
pelúcida. A criação dessa subordem
foi baseada nas características aberrantes desses isópodes venezuelanos tais
como redução do télson; primeiro
pleópodo com o endopodito reduzido; II pleópodes do macho sem o apêndice
masculino; na fêmea o I pleópode menor que o III; e II pleópode na fêmea com
endopodito menor que o exopodito.
No Brasil embora já
tivesse sido descrito crustáceos aquáticos troglóbios de outras ordens tais
como Amphipoda e Decapoda, o primeiro isópode aquático troglóbio foi descrito
em 2002.
Esse foi encontrado no interior da Bahia, em uma caverna conhecida
como Toca do Gonçalo, situada no interior do município de Campo Formoso,
próximo a localidade de São Tomé.
Essa
caverna já era conhecida por abrigar outro interessante troglóbio, um bagre
cego miniaturizado. veja link abaixo pra saber mais sobre o peixe.
Vilarejo onde se encontra a Toca do Gonçalo. Campo Formoso - BA.
Ao fundo afloramento calcário da Toca do Gonçalo.
O Calabozoa encontrado em Campo
Formoso foi descrito com o nome de Pongycarcinia
xiphidiorus. E é considerado um espécime relicto, isto é, organismos que já
foram abundantes no passado, mas que agora estão separados em localidades restritas.
Nesse caso um exemplar na Venezuela na bacia do rio Orinoco. E outra na região
semiárida do Brasil, Bacia do rio São Francisco.
A sugestão é que essa
distribuição em uma época que esses organismos eram abundantes tenha ocorrido sob o leito e margens de rios
da bacia do Amazonas, o que permitiria e conexão entre localidades tão
distantes.
Esse é o Pongycarcinia xiphidiorus, Um calabozoa altamente troglolmórfico isto é, sem pigmentação e olhos e com outras especializações para o meio subterrâneo.
A despeito da grande importância dessa caverna por abrigar organismos tão raros e de importância científica inestimável, a caverna é considerada uma das mais afetadas por impactos humanos da região da caatinga.
Localizada em um pequeno vilarejo representa a única fonte de água, e por décadas a água da caverna era extraída através de uma bomba d´água a diesel que lança fumaça na atmosfera cavernícola e contamina o lençol freático com óleo. Em 2010 foi adicionada na caverna uma bomba elétrica por moradores de outros vilarejos com propósitos de irrigação, essa bomba tem causado um severo decréscimo no nível freático da caverna.
Depois que pesquisadores da UFLA estiveram lá pra estudar a sua fauna peculiar e ficaram assustados com a situação delicada que envolve por um lado a conservação de um ambiente de extrema importância para a ciência e de outro lado problemas socioeconômicos. As agencias ambientais foram informadas e foi negociado com o município a retirada das bombas d´água e a implantação de poços artesianos.
A última visita feita pelo grupo
CAACTUS na Toca do Gonçalo ( outubro de 2012) constatamos que as bombas foram
retiradas.
A entrada vista pelo lado de dentro, detalhe do cano que leva a água da caverna para as cisternas da comunidade.
Bomba d água movida a óleo diesel retirando a água da Toca do Gonçalo. foto de 2010.
Detalhe dos condutos tipicamente freáticos da Toca do Gonçalo.
Recentemente os mesmos
pesquisadores da UFLA coordenados pelo professor Rodrigo Ferreira Lopes, fizeram
uma extraordinária descoberta em uma caverna do município baiano de
Paripiranga. Descobriram mais um
calabozoa, esse com características tão particulares que foi sugerido não só um
novo gênero Brasileirinho cavicatus, Mas
até uma nova família que é Brasileirinidae! Essas novas descobertas vão
esclarecer o parentesco desses animais tão curiosos.
Em A os diminutos indivíduos da espécie Brasileirinho cavicatus, de B - D detalhes desses exemplares, E e F detalhes da caverna da Baixa funda em Paripiranga - Ba.
Fotos e informações retiradas de Prevorcnik, Ferreira e Sket 2012.
Quantas peculiaridades nessas cavernas
ResponderExcluir