Primeira
semana de março de 2025. Encerrava-se minha jornada como residente de
hematologia. Basta um tempo livre para o instinto explorador aflorar. E eu só
pensava nos afloramentos de calcário que tinha visto meses antes. Mandei
mensagem para André para verificar sua disponibilidade em prospectar. Logo
entramos em um consenso: sexta pós-carnaval iríamos na Toca do Vicente e, em
seguida, prospectar o paredão de calcário que vi em janeiro. No sábado, o
caminho seria a região de Casas Velhas (distrito de Campo Formoso), onde fica
situada a Lapa do Convento e também há um lajedo dentro das terras do nosso bom
e velho Josan que precisava ser averiguado.
Partimos na manhã do dia 07/03/25, eu e
Eugênia, agora casados, para mais uma aventura, guiando o Suzuki Jimny branco
(Samurai Jack). Esquecemos Joana em Senhor do Bonfim por um erro de comunicação
(que vacilo!). Encontramos com André em Campo Formoso. Como sempre, paramos no
mercadinho em Poços para comprar o que comer, composto de barrinhas de cereais,
fiambre, pão e suco em pó (almoço 5 estrelas).
Eugênia disse na venda que o melhor pó
de suco que ela já experimentou foi o da "baleinha" (figura 1), marca
indisponível na venda e nunca vista antes. Depois dessa informação e
inesperada, seguimos até a região da Gruta do Angico. Alguns quilômetros de
estrada de chão, abrir e fechar de porteiras, paramos o carro na sombra ao lado
da antiga casa de seu Idelso, morador antigo da região. Ele quem indicou as
grutas da região para André (época em que completou os 33 anos, os quais
perduram até hoje). Passamos por algumas plantações de sisal, cujas pontas são
perversas. Passamos por alguns trechos de caatinga fechada, muitas vezes
abertas na marra, já que o facão de André era cego (dos dois olhos). Alcançamos
um pequeno leito de riacho seco, por onde caminhamos mais livremente.
Felizmente esse seguia em direção a uma das entradas da Toca do Vicente.
Fig.1. Nostalgia de Eugênia
Fig 2. Rastejo externo em leito do rio seco para alcançar a entrada da Toca do Vicente.
Adentramos
a gruta por um pequeno rastejo lateral, evitando a entrada principal por conta
das abelhas. André já chegou na gruta com a bateria nas últimas. Seguiu ele
para a coleta de ossos (uma mistura de ossos de veado, porco do mato e tamanduá bandeira).
Talvez alguma onça fizesse a Toca do Vicente como sala de jantar. Explorei dois
rastejos, que, para nossa surpresa, apresentavam desenvolvimento digno de nota.
Ambos eram bem estreitos no primeiro terço, mas ganhavam expansão volumétrica
em seguida e desenvolvimento horizontal de alguns metros (não mais que 100
metros). Em um deles, o final tinha grande quantidade de lama, o que
proporcionou algumas quedas cenográficas quando tentei subir uma inclinação. A
gruta possuía fauna bem ativa, com grilos, sapos, centopeias, morcegos, entre
outros. No salão principal, com grande quantidade de guano, procuramos a
entrada/saída principal. Consiste em uma fenda com sedimento e inclinação
superior, na margem do salão. Foi nesse momento que Eugênia recebeu uma
morcegada no rosto, um tapa. Não pela agressão morcegoide, mas sim pelo risco
de ataque de abelhas, retornamos para a saída do rastejo e nos despedimos da
Toca do Vicente.
Fig.3. Alguns registros da Toca do Vicente.
De
volta ao carro, pegamos a estrada de chão retornando a fim de nos aproximar de
um paredão de calcário que certa vez visualizei. Considerando a Toca do Angico
como referência, a Toca do Vicente estaria alguns metros frontalmente, enquanto
o paredão de calcário numa parte posterior ao Angico. Paramos o carro ao lado
de uma cerca relativamente próxima a esse afloramento. Sobrevoei a área para
certificar a localização do paredão de calcário e averiguar possíveis caminhos.
Passamos a cerca e seguimos por diminutas trilhas feitas por criançada.
Fig.4. Imagens de drone do afloramento
Frequentemente,
a trilha apagava e dava na caatinga fechada. Atravessamos o mato na cara e na
coragem. Era
cada lapada de urtiga, cansanção e favela. Espinhos agulhados para todo lado.
Pense aí numa vegetação valente. É assim que o bioma lutou com Canudos na
guerra. A caatinga por si só é uma fortaleza. Ainda fomos atacados por uma
gangue de irapuás. Fizeram uma confusão com o cabelo de Eugênia. Após muita
luta, chegamos próximo à parede. Um baita calcário, alto e prolongado
horizontalmente. Com um corredor longo entre dois muros. Porém, o acesso às
suas margens era difícil. A vegetação ficou ainda mais compacta. Era até
visível algumas clareiras poucos metros à frente. Mas, percebendo o caminhar
das horas (pouco mais de 17 horas), decidimos não prosseguir. Ainda restava o
desafio de encontrar o caminho de volta com o sol se pondo. A vegetação ocultou
os lugares por onde passamos. A luminosidade já baixa e o cansaço dificultaram
ainda mais a orientação.
Figura 5. Avistamento do afloramento por baixo.
Felizmente,
André tinha gravado a trilha no GPS do celular. Após alguns erros de trajeto,
pegamos o caminho de volta. Os dois objetivos primários do dia foram
alcançados. Já no carro, projetávamos uma futura expedição para concluir a
prospecção desse calcário. Por hora, recarregar as energias, pois no dia
seguinte teria mais (parte 2).
Figura 6. Aquela sensação de descobrir algo novo!
Uma crônica de Leonardo Bamberg
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