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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Talhado do lixão: De ogro e louco todo espeleólogo tem um pouco.



Ao ver essa imagem você pode se perguntar como um ser humano pode chegar a esse estado de “xexelência”. Entretanto, não se engane! Tudo começa assim, sentado confortavelmente lendo uma postagem como essa. Um contato, uma conversa e quando você menos esperar vai estar em um cenário claustrofóbico entregue à lama e a sujeira.



Nem toda caverna está em uma área com água azul cristalina e nem toda caverna possui amplos salões arejados e ornamentados que compensa todo tipo de obstáculo que temos que transpor. 

Existem cavernas que são marginalizadas por serem pequenas e fedorentas ou situar em áreas com lixo e esgoto. Mas toda caverna é importante, nunca se sabe onde encontraremos um animal raro, ou um vestígio de épocas remotas e por isso é importante conhecer toda caverna mesmo as pequenas e tentar denunciar cavernas que por serem pequenas e não visitadas sofrem maiores impactos.



Nessa perspectiva é que fomos conhecer uma caverna chamada Talhado do Lixão, que fica localizada a 1 km do lixão a céu aberto da cidade de Campo Formoso e a poucos quilômetros de outras cavernas como a Toca do Angico e a Toca do Matias.


O local onde é depositado o lixo a céu aberto no município de Campo Formoso é próximo a uma área que concentra importantes cavernas como a Toca do Angico, Toca do Matias e Talhado do Lixão que estão a menos de 2 km do lixão. As cavernas da Tiquara (várias) estão a menos de 5 km da área. Essa proximidade pode trazer riscos de contaminação para o habitat cavernícola.

A chegada ao lixão é impactante, ver o contraste entre o ambiente natural e as marcas deixadas pelo homem e principalmente perceber as famílias que vivem em condições precárias naquele ambiente nocivo é um choque de realidade.  Pegamos a informação com um morador de um barraco sobre pra que lado fica a caverna e rapidamente (apesar da estrada não ajudar) chegamos ao nosso destino.
 Entrada do Lixão.


O talhado é um grande paredão calcário de cor laranja vibrante contrastando lindamente com o verde exuberante que a caatinga apresenta nessa época chuvosa. Contemplar essa paisagem é de encher os olhos e por alguns instantes esquecemos que pouco antes passamos pelo desagradável depósito de lixo.


Uma visão geral do talhado.


Uma curiosidade sobre o talhado é que uma parte do paredão está separada e inclinada provavelmente como consequência de algum evento (falha) geológico (a). 






Foto oficial da expedição 01/16.  William ( recruta), Paulo (Barriga), Cleiton, André, Jorgean, Aspira (Cajado) e Anderson. Ao fundo uma parte do talhado inclinado, como a Torre de Pizza. Foto Gabriel (zangão).


Na trilha para caverna encontramos uma árvore (talvez gameleira) com grandes dimensões e que uma parte de seu tronco e raiz foi cortada de forma que permite acesso a seu interior formando um tipo de abrigo que cabe fácil umas dez pessoas em pé. Essa árvore por si já garante uma experiência no mínimo inusitada a quem visitar esse local. 

Abrigo da árvore.

Após a árvore nos deparamos com a entrada da caverna. Apesar de estreita a entrada é bem acessível, depois de alguns passos já na escuridão aparece uma fenda pouco profunda, mas com certa dificuldade. Notamos um feixe de luz vindo da esquerda e pensamos se a outra entrada de onde vem essa luz não seria mais fácil. 

Meia volta e contornamos por alguns metros o paredão e encontramos a segunda entrada essa é mais estreita ainda que a primeira e bem mais baixa o que dificulta um pouco o acesso. Porém depois que rastejamos por alguns blocos abatidos o caminho não temos mais dificuldades.



 As duas entradas do Talhado do Lixão.


A caverna apresenta um pequeno salão após a entrada com duas estreitas ramificações. Uma única dessas ramificações prossegue na forma de um conduto na parte esquerda. Porém prossegue através de um rastejo em um túnel claustrofóbico.





Na semana que ocorreu a expedição choveu torrencialmente na região, em decorrência disso a caverna estava bastante úmida e com muita água escorrendo das paredes e teto. Então, o rastejo nesse conduto era tarefa árdua não apenas pelo esforço físico mais também por ter de ficar em um espaço confinado deitado e se arrastando em uma gosma que misturava fezes de morcegos e de outro bicho (provavelmente porco do mato) e uma lama amarelada que escorria da parede. Sem falar no cheiro de animais em decomposição. Enfim, um cenário desencorajador para marinheiros de primeira viagem. 





Depois de averiguar esse conduto voltamos e percebemos que não tinha mais nada a fazer na caverna Talhado do Lixão. Apesar da situação xexelenta devido à lama e restos biológicos naturais. Não percebemos na caverna nenhum impacto direto derivado da proximidade do lixão. 



Exploramos um pouco o paredão conhecido como talhado e não encontramos, mas nenhuma entrada. Como ainda era cedo, resolvemos visitar outras cavernas nas proximidades; Antes ao passar pelo lixão distribuímos lanches para algumas crianças que vivem no local.


Momento solidário

A primeira caverna que tentamos visitar após a visita do talhado do lixão foi a Toca do Matias, porém não tivemos sucesso devido a um enxame de abelhas que apesar de ser característica constante na entrada dessa caverna, nessa ocasião estavam “inflamadas” acabou ainda ferroando Paulo barriga. Um dos integrantes da expedição o Gabriel tem severa alergia e não quisemos arriscar. Fomos então visitar a Toca do Angico e procurar por algumas passagens que deixamos de averiguar em expedições passadas. 

Similar ao que ocorria no Talhado do Lixão, a Toca do Angico também apresentava muita água escorrendo pelo piso e paredes. E como a concentração de guano principalmente de guano hematófago no Angico é bem maior. A gosma negra que se formava pelas galerias e condutos que estávamos explorando eram mais nojentos que a do Lixão. 


Água e guano escorrendo por toda a Toca do Angico.

Chegamos a uma parte da Toca do Angico que nunca exploramos. Nesse local havia passagens superiores e níveis inferiores. E Tanto em cima como em baixo estava ruim de chegar devido à gosma que deixava tudo escorregadio.   Anderson foi o primeiro a descer por um buraco de pouco mais de 2m de altura e explorar o nível inferior. Não demorou muito e ele anunciou que tinha encontrado uma ossada, então todos seguimos esse caminho para observar essa ossada. Quando cheguei ao local anunciado percebi que ossada na verdade era um esqueleto de urubu (um pouco decepcionante). E agora estava ruim de voltar pelo mesmo local que descemos. Então nos restava seguir em frente e tentar a sorte de uma saída à frente. 

Alguns dos aracnídeos encontrados entre outros bichos como baratas e caramujos. 

Caindo na escuridão do submundo nos lançamos por um caminho de fendas, passagens fechadas, salões com blocos abatidos com ar soberano que por instantes podíamos contemplar.  Alguns insetos medonhos, aranhas nocivas e um caminho cansativo até avistarmos luz novamente.  Um local onde o teto desmoronou e apesar de relativamente alto permitia que chegássemos até a superfície após escalar um monte de terra e escombros, atravessamos o oceano de sombras e voltamos ao mundo banhado pelo sol.  E com essa experiência é que começamos o ano e aguardamos que as próximas expedições nos encham de assombro e encanto. 


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